Neste encontro trabalhamos regidas por um mito da criação,
resgatado por Jamie Sans, As 13 Mães dos Clãs Originais. Cada uma delas
resgata um aspecto da sabedoria feminina, cuja missão é trazer o equilíbrio
perdido de volta a humanidade e ao planeta Terra.
Cada Mãe tem sua lunação, e o mês de março é a que Pesa a Verdade.
Quando mais de uma mulher, se propõe a mobilizar um tema
transformador, e quando este tema tem sua origem num povo originário, podemos nos
conectar com energias sutis do campo coletivo e se estivermos dispostas a
receber suas influências, podemos despertar sabedorias, emoções e fortes resistências
dentro de nós. O aprendizado da alma se dá na observação mais profunda do movimento
da vida, na escuta das “entrelinhas” do nosso cotidiano... Desafio cada vez
maior nos nossos tempos de excessos. Por isso, vez ou outra cabe a ousadia de se lançar em experiências compartilhadas em
grupo, que busquem estimular visões mais subjetivas, simbólicas, que nos convide
a ir um pouco mais além da visão comum. As mulheres, os artistas, as crianças,
os indígenas .... têm estas “manias”.
Com este objetivo, lá fomos nós, encarar a dinâmica da
verdade, a ciência de ser movidas por ela. Eu, psicóloga arteterapeuta e Marta
Medeiros, focalizadora de danças circulares, resolvemos compor uma vivência com
escuta da história, dança das etapas narradas nela e depois sentarmos em roda e
nos ouvir.
O momento é sempre único, mesmo que acreditemos estar no
controle da situação. Sim, a gente ainda insiste nesta bobeira.
A semana que antecedeu o encontro foi difícil, fiquei
doente, tinha dúvidas se conseguiria estar presente e com energia. Decidi ir ,
mesmo ainda doente, confiando na energia da cura e do grupo. Na noite anterior,
dia Internacional das Mulheres, assisti um espetáculo com uma atriz indígena,
fiel a sua língua materna, que por sua vez significa “fala verdadeira” e o qual
me tocou profundamente. Minha vulnerabilidade me convidava à humildade. Fiz
ajustes e usei da prática simples da verdade para me equilibrar. Aceitei meus
limites e os que foram apresentados, quando por exemplo o som da sala não
funcionou.
As sincronicidades seguem se manifestando em detalhes e
belezas; duas participantes faltaram, outra precisou sair antes do final e no
fim éramos 13 mulheres!
Os ventos entravam de formas diversas na sala, vento forte,
vento leve, vento com chuva, sem vento... e
assim que contei a seguinte História
Mãe do Terceiro Ciclo Lunar
Pesa a Verdade sentou -se em sua cabana circular feita de
barro e galhos de bétula. Era uma noite de verão e la não precisava do fogo
para se aquecer durante sua meditação. Nessa noite ela estava acompanhada do
espírito da Coruja, animal totêmico que tem o poder de eliminar a mentira e a
decepção.
Pesa a Verdade se confrontava com uma situação na qual suas
habilidades para encontrar o equilíbrio da justiça eram demandadas. Alguns dias
antes, duas mulheres da tribo vieram até ela para lhe pedir um julgamento.
Àguas que Correm havia acusado Ganso Azul de ter pegado, às
escondidas, mais do que lhe era devido do depósito comunitário de alimentos. Por
sua vez, Ganso Azul acusava Aguas que Correm de espalhar boatos a seu respeito,
de ser mexeriqueira e de se intrometer no Espaço Sagrado alheio.
A Guardiã da Justiça passou então quatro dias e noites
pesando a questão. Quando o Avô Sol se levantasse no próximo dia, ela
anunciaria sua decisão perante o Conselho da Tribo. Para enxergar além das
ilusões desse situação conflituosa, Pesa a Verdade dirigiu-se às quatro
direções e pediu a orientação dos Quatro Ventos. A cada noite ela se dirigiu a
uma direção fumando seu Cachimbo com tabaco sagrado, invocando os espíritos de
cada direção.
Na primeira noite, o Vento do Leste lembrou-se de que quando
se clareia uma situação com a luz do amor incondicional, a luz do Avô Sol
ilumina o buscador para que sua visão esteja livre de preconceitos. Na segunda
noite, os Espíritos do Sul lhe falaram sobre as lições de humildade e inocência
que precisavam ser aprendidas nessa situação.
Na terceira noite, ela chamou o Vento do Oeste que respondeu
mostrando-lhe como sua decisão poderia afetar o futuro das duas mulheres da
tribo até mesmo das gerações vindouras. Quando o quarto dia chegou, o Vento do
Norte soprou, e Pesa a Verdade sentiu toda gratidão pelas respostas já
recebidas e pediu a cura de todos envolvidos na situação.
Ela chamou o espírito da Coruja, guardião da direção de
cima. Chamou também o guardião da direção de baixo, a Doninha, cuja qualidade é
a de observar as evidências para trazer a verdade à Luz. Pediu a presença do
Corvo, cuja sabedoria e discernimento destroem a decepção. O quarto espírito
totêmico a se apresentar foi o Crocodilo, que auxilia a digerir e assimilar a
verdade. A presença dos animais de poder fortaleceram as habilidades de
julgamento de Pesa a Verdade.
Para chegar ao âmago da questão, ela tinha que olhar para
aquilo que estava por trás da situação e das atitudes daquelas mulheres. Ela
viu com clareza que o que movia Ganso Azul era a culpa, pois ela se sentia
culpada por haver perdido seu filho caçula na última lua da fome. Seu trauma
era tamanho que mesmo tendo alimento suficiente para si e sua família,
escondia-se para pegar mais comida no depósito da comunidade.
Águas que Correm, por sua vez, era dominada pela carência.
Em sua infância, com 20 irmãos e irmãs, sua mãe mal decorava o nome de todos. Ela
não tinha nunca quem a ouvisse ou se interessasse por suas palavras, assim,
quando adulta, tornou-se uma faladeira compulsiva, sempre chamando a atenção
para si e causando estardalhaço.
Quando o Conselho da Tribo reuniu-se para ouvir a decisão de
Pesa a Verdade, as duas mulheres se apresentaram, ela olhou com bondade nos
olhos de cada uma e proferiu seu veredito.
“Para que o equilíbrio se restabeleça em nossa tribo, em
suas famílias e em seus corações, ambas precisam passar por experiências
curadoras. Durante as p´roximas 13 Luas, Ganso Azul irá trabalhar algumas horas
a mais para recolher frutos e tibérculos e vai distribui-los às famílias que
tiveram algum membro morto pela fome. A cada semana ela irá ajudar uma dessas
famílias, vai conviver com pessoas que passaram pela mesma dor de ter os filhos
mortos pela fome ou vai cuidar das crianças cujos pais se foram pela mesma causa.
Enquanto isso Águas que Correm irá acompanha-la em silêncio, apenas observando
sem proferir uma palavra sequer, pelas próximas 13 Luas”
E assim, a decisão foi acatada por todos.
13 Luas se passaram, ao final das quais o Conselho reuniu-se
novamente para ouvir o relato das mulheres.
A primeira a se pronunciar foi Ganso Azul: “ Neste tempo de
cura, aprendi que cada membro da tribo também já sofreu com perdas. Compartilhei
minha dor e me desfiz do medo da escassez que me atemorizava. Estou em paz
comigo mesma, pois não carrego mais a culpa e a vergonha que toldavam meu
espírito. Minha família agora se estende além dos laços de sangue, pois amei
cada criança que tomei aos meus cuidados”
Águas que Correm, que não havia pronunciado palavra há 13 Luas, levou alguns minutos para reencontrar sua voz. “Essse tempo de cura mudou completamente minha atitude, meu caminho e minha compreensão de mim mesma. Ao ouvir as histórias dos outros, via e ouvia minha própria história de transformação. Compreendi profundamente a necessidade que eu tinha de ser reconhecida como uma pessoa valorosa. Aprendi a deixar de lado a crítica, o julgamento e ter compaixão por mim e pelos outros”
As duas mulheres, agora amigas de coração, estavam extremamente
gratas a Pesa a Verdade, por sua sabedoria ao dar a elas aquilo que
precisavam para cura de suas almas.
(tradução livre do
livro The Thirteen Original Clan Mothers, Jamie
Sans)
As Danças
A primeira
dança Circular foi Conectando Corações
Uma dança
sutil de muita reverência e que tinha um
momento muito delicado onde nos movíamos tocando o coração uma das outras,
formando uma corrente na altura do cardíaco
A segunda
foi uma dança infantil, um brinquedo de roda para olhar no olho, tocar e
confiar na dupla e manter a dança.
Brincadeira,
choradeira pra quem vive uma vida inteira! Mentirinha, falsidade, pra quem vive
só pela metade!
A terceira
reverenciar a Mãe Terra para se estruturar e decidir
PachaMama
A quarta uma
reunião de movimentos mais livres para agradecer e curar
Um ponto
forte de energização e conexão
Com esta
qualidade de energia nos sentamos para nos sentir e ouvir. Infelizmente não tínhamos
quatro noites nem o apoio dos animais de poder. Mas conseguimos nos expressar com afeto e verdade. Era nítido que não éramos as mesmas depois daqueles ventos especiais.
A Extensão
da experiência é responsabilidade de cada uma. Os ciclos são necessários, tudo
tem seu tempo
Até a
próxima!
Grata pela presença e confiança!